sexta-feira, 29 de março de 2013

OS PSEUDO-ARGUMENTOS UTILIZADOS POR QUEM É CONTRA O CASAMENTO CIVIL HOMOSSEXUAL





 1- A HOMOSSEXUALIDADE NÃO É NATURAL.

Primeiramente, o que é natural? Em um sentido básico natural é aquilo que vem da natureza, que é próprio dela e que é regido pelas leis naturais. O ser humano é uma construção antropológica complexa que engloba o natural e o cultural. Somos os únicos animais que utilizamos roupas para nos cobrirmos, algo que não é natural, mas cultural. Assim que nascemos - nus - nosso cordão umbilical é cortado e colocam-nos uma toalha, logo depois uma vestimenta. A partir de tal episódio, imiscuir-se a cultura à natureza.

Outros exemplos clássicos de como a nossa cultura interfere no nosso modo de vida, afastando-nos de um caráter "natural" ou simplesmente ratificando o fato de sermos uma mescla entre o cultural e o natural, é o fato de nos depilarmos. Nenhum outro animal se depila. Da mesma forma não existe distinção - a não ser a biológica - entre machos e fêmeas em uma espécie. O que leva a mulher a depilar as axilas e o homem, em muitos casos, a deixá-la intacta, engloba dois conceitos culturais: a depilação e a DISTINÇÃO entre o que se convencionou ser culturalmente feminino e culturalmente masculino.

 Agora, gostaria de introduzir um novo conceito: o que é comum e o que não é comum e como, ao falarmos de "é natural" e "não é natural" estamos muito mais próximos de um julgamento CULTURAL do que é comum e não é comum para uma determinada sociedade do que de um julgamento natural. Na verdade, não existe julgamento natural algum ao usarmos o termo "natural" ou "antinatural", uma vez que qualquer coisa que advenha DA NATUREZA é natural, ainda que possa parecer INCOMUM para o nosso julgamento CULTURAL, como, por exemplo, algumas mutações ou grandes catástrofes.

 Peguemos dois exemplos triviais: uma mulher pintar o cabelo de loiro e depois de rosa. No primeiro caso, dificilmente alguém julgará tal mulher da seguinte maneira: não é natural. Não estou colocando aqui o conceito de ARTIFICIALIDADE que é uma acepção CULTURAL, mas sim o entendimento do que é ser NATURAL. Do ponto de vista cultural, ela poderá ser julgada sob o aspecto de que a cor do cabelo não é verossímil à cor original (natural) do cabelo. Mas a ação em si - o de pintar o cabelo de loiro - não será julgada como sendo "antinatural", apesar de ser, uma vez que naturalmente essa moça não possui cabelos daquela cor. O que se julga em questão, nesse primeiro caso, é se os RESULTADOS da ação serão considerados naturais ou artificiais. E por quê? Porque, em nossa sociedade, o fato de uma mulher pintar o cabelo é considerado "natural", donde natural é sinônimo de COMUM CULTURALMENTE e não de algo que provém da natureza. O segundo caso, no entanto, vai gerar mais discussões. Alguns, inclusive, falarão, ANTES DO RESULTADO, que "não é algo natural". Ora, o fato de pintar o cabelo não é algo natural em sua essência, mas o loiro, além de ser encontrado em algumas pessoas originalmente (naturalmente) e o rosa são, é muito mais COMUM. Quantas mulheres pintam o cabelo de loiro e quantas pintam de rosa? Dessa forma o conceito de natural passa pelo critério de ARTIFICIALIDADE - se se parece ou não com algo verdadeiro, original, da natureza - e pelo conceito do comum (se é algo frequente ou recorrente em nossa sociedade). Mas, deixando os conceitos culturais de lado, pintar o cabelo não é natural, simplesmente por utilizar manipulações químicas e intervenções que não estariam presentes sem a intervenção do homem. A única forma genuinamente natural de alterar a cor dos cabelos é pegar horas e horas de sol.

 Continuando com o exemplo acima, mas alterando o sexo percebemos com mais clareza como o conceito de natural misturou-se ao conceito cultural do que é comum ou não e do que é aceito ou não por uma dada cultura. Um homem, ao pintar o cabelo de loiro, possivelmente enfrentará muito mais resistência que uma mulher. Em caso desse cara lidar com pessoas mais preconceituosas, comumente ele ouvirá a frase "Não é natural um homem pintar o cabelo de loiro". Ora, mas se a mulher pode e, caso os resultados não sejam considerados artificiais pela maioria, dificilmente alguém a julgará, por que um homem não pode fazer o mesmo? Fica claro, mais uma vez, que o conceito nada tem a ver com natural de natureza, mas de comum ou não comum ou daquilo que a maior parte da sociedade aceita ou não aceita. Mas, quando se usa a desculpa de que é antinatural, parece que não existe um julgamento cultural preconceituoso, mas tão somente uma condição da natureza, donde podemos separar, sem interferências culturais, o que é natural daquilo que não é. Mas, como já foi mostrando aqui, em todos os casos pintar o cabelo ou se depilar não é algo natural. É comum ou não comum. É um julgamento valorativo de acordo com o que é comum ou não de acordo com uma determinada sociedade. Não há nenhum julgamento natural e se assim seguíssemos nossas vidas, deixaríamos de nos vestir, de pintar o cabelo e de nos depilarmos, pois tudo isso é antinatural.

 No caso da homossexualidade, o que parece mais estranho é o fato de - ao contrário de pintar o cabelo, depilar-se ou vestir-se - existem muitas espécies de animais que praticam sexo homossexual ou que tem comportamento homossexual. Logo, nesse aspecto, a homossexualidade seria muito mais natural do que pintar o cabelo, depilar-se, vestir-se. Aliás, partindo do pressuposto de que a homossexualidade não é algo inventado pelo homem, percebe-se com mais clareza o fato de que a sociedade julga o natural e o não natural sob um aspecto do que é comum ou não e pior do que é MORALMENTE aceito ou não.

 Dessa forma, não cabe o argumento de que a homossexualidade é algo errado, porque é antinatural, uma vez que foi demonstrado aqui que diversos atos considerados "naturais" não o são. E, ao contrário, a homossexualidade - que muitos dizem ser antinatural - é o mais natural dos exemplos aqui dados.

 Ainda pode haver uma resistência dizendo que a natureza inventou macho e fêmea e que os órgãos genitais do macho se coadunam com a da fêmea e vice-versa. Acontece que essa mesma natureza também criou seres hermafroditas - como no caso das minhocas - que possuem ovários e testículos. Na própria espécie humana, embora não seja comum, também existem seres hermafroditos. Dessa maneira seres híbridos - que não são macho nem fêmea - ocorrem naturalmente, sem interferências humanas.

 Por fim, alguns argumentam que não é natural, pois não tem como haver reprodução em um sexo homossexual. Mas, mais uma vez, na natureza existem animais que são naturalmente estéreis como a mula e o burro. Apesar de no geral terem órgãos sexuais pouco desenvolvidos, existem diversos casos documentados de que esses animais também transam, ou seja, o sexo sem reprodução também ocorre na natureza.

 2 - NA BÍBLIA DIZ QUE A HOMOSSEXUALIDADE É ERRADA.

Isso é correto. Existem passagens na Bíblia que mencionam isso. A problemática, no entanto, vai bem, além disso. Tendo a Bíblia como referência, a mesma diz, no novo testamento o seguinte:
"Ou não vos ensina a mesma natureza que é desonra para o homem ter cabelo crescido? Mas ter a mulher cabelo crescido lhe é honroso, porque o cabelo lhe foi dado em lugar de véu. Mas, se alguém quiser ser contencioso, nós não temos tal costume, nem as igrejas de Deus1 CO 11.14-16."

 Logo, mulheres de cabelo curto e homens de cabelo longo são tão desonrosos quanto um homossexual.

 Continuando, um trecho extraído da revista Superinteressante: "Se o Livro Sagrado proíbe a cobrança de juros, mas só entre judeus, o mesmo vale para a escravidão. Você pode ter escravos, contanto que "sejam das nações que estão ao redor de vós; deles comprareis escravos e escravas", diz o Levítico. Mas havia uma exceção: era possível a um judeu endividado vender a si mesmo para o credor."

 Dessa forma, é moralmente aceito pela Bíblia que as pessoas tenham escravos. Como não pode ser da mesma nação, nada impediria, para um cristão ortodoxo, comprar um escravo paraguaio, por exemplo, ele não estaria pecando, pelo contrário.

No Antigo Testamento, a poligamia era abertamente aceita, como demonstra trecho retirado da revista SuperInteressante:

 "Poucas coisas mudaram tanto nos últimos 3 mil anos como a instituição do casamento. Então esse é o nosso primeiro tópico. Para começar, o Velho Testamento deixa claro que as mulheres deveriam ser funcionárias de seus maridos. Funcionárias mesmo: não só com deveres, mas com direitos também. Se uma esposa fosse "demitida" pelo parceiro, por exemplo, podia ganhar uma carta de recomendação, que a moça podia usar como trunfo na hora de tentar uma vaga de mulher de outro sujeito.

Não é exagero falar em "vaga": um homem podia ter tantas esposas quanto quisesse (ou melhor: quanto pudesse adquirir e sustentar). A poligamia era a regra. Tanto que o primeiro caso aparece logo no capítulo 4 do primeiro livro da Bíblia: "E tomou Lameque para si duas mulheres" (Gênesis)”.

O Novo Testamento não fala muito sobre a poligamia, mas deixa claro que ela era comum e moralmente aceita. Em mais um trecho extraído da Superinteressante, temos o seguinte:

"O Novo Testamento não cita tantos exemplos de poligamia, mas sugere que ela ainda era comum no século 1. Jesus não toca no assunto, mas, em duas cartas, são Paulo recomenda que os líderes da nova comunidade cristã tenham apenas uma esposa porque "assim eles teriam mais tempo para dedicar aos fiéis". "O cristianismo só refuta a poligamia quando se aproxima do poder em Roma, que proibia a poligamia", afirma Brettler. Como escreve santo Agostinho no século 5, "em nosso tempo, e de acordo com o costume romano, não é mais permitido tomar outra esposa".

 Dessa forma, fica claro que a mudança, longe de ter sido moral, foi motivada por um caráter político.

Ademais, para os católicos, a própria Igreja Apostólica Romana, emitiu em meados de 1975 um aviso de que as interpretações da Bíblia não devem ser literais. E que a linguagem utilizada é muitas vezes metafórica e inerente àquela época.

Alguns religiosos precisam, além disso, deixar de ser egocêntricos. Em escrituras mais antigas e consideradas sagradas - os Vedas, por exemplo- que formam a base do Hinduísmo e foram escritos bem antes da Bíblia não existe qualquer menção de que a homossexualidade seja algo errado. Pelo contrário, nos Vedas existe a menção a três gêneros diferentes: os homens, as mulheres e o terceiro sexo. Vejam:

 “Os mecanismos da variação biológica do homem e da mulher “normais” sempre envolvem alterações no padrão de desenvolvimento. Mas isso não quer dizer, entretanto, que tais alterações são erros biológicos ou “erros” da natureza de Deus. As pessoas normalmente assumem que todo membro da sociedade humana deveria ser diretamente envolvido no processo de reprodução sexual, mas nós podemos observar que na natureza bem frequentemente não é esse o caso. Em muitas espécies altamente sociáveis, membros não reprodutivos têm um único e um importante papel. Por exemplo, numa colônia de abelhas, a rainha sozinha é a fêmea reprodutiva, enquanto que abelhas trabalhadoras são todas um “terceiro sexo” ou não reprodutivas e estéreis (...).

 "Na literatura védica, o sexo e o gênero dos seres humanos é claramente dividido em três categorias separadas, de acordo com sua prakriti, que traduzido literalmente significa “natureza”. Estes são pums-prakriti ou homens, stri-prakriti ou mulheres e tritiya-prakriti, ou o terceiro sexo. Estas três categorias não são determinadas por suas características físicas somente, mas por uma avaliação do ser humano total, que inclui o corpo físico, o psíquico e uma única consideração baseada na interação social (seu status procriativo). Geralmente o termo “sexo” se refere ao sexo biológico e gênero ao seu comportamento psicológico e identidade. O termo prakriti ou natureza, entretanto, implica ambos aspectos juntos como uma unidade intricadamente costurada e coesiva." trecho retirado do blog http://evolucaolgbt.blogspot.com.br/2010/03/chico-xavier-homossexualidade-e-os.html 

 Portanto, fica claro que se utilizarmos a Bíblia como parâmetro, vários dos nossos comportamentos também deveriam ser mudados. Algumas coisas consideradas moralmente aceitar pela sociedade deveriam ser revistas e outras consideradas imorais deveriam passar à categoria de moral. Por que somente a homossexualidade é atacada? E mais, por que os fiéis que atacam a homossexualidade, com base na Bíblia, não a seguem de maneira rígida e também cometem outros pecados condenados por um livro eles próprios usam pra dizer que a homossexualidade é errada? Nesse caso, nada mais justo que ou eles aceitam a homossexualidade ou eles serão obrigados a rever a vida deles também, pois caso contrário, estarão apenas se utilizando "dois pesos e duas medidas", longe dos ensinamentos bíblicos de fato aos quais eles tanto se apegam.

 Por fim, como já mencionado, não se pode querer impor a Bíblia à sociedade. Existem diversos livros sagrados de outras religiões, como os Vedas por exemplo. Dessa maneira, a imposição de que a homossexualidade é errada única e exclusivamente baseada na Bíblia, faz-nos perceber a ditadura religiosa pela qual algumas pessoas querem impor as convicções dela sobre as outras. E, como já mostrado, de maneira contraditória, eliminando-se a parte da Bíblia que não lhes convém e enfatizando as que convêm. Isso é religião ou manipulação?

3- DEUS CRIOU ADÃO E EVA E SE A HOMOSSEXUALIDADE FOSSE CORRETA, DEUS TERIA CRIADO ADÃO E IVO.

 Esse argumento é até engraçado. Alguns falam dessa forma, outros falam Deus criou o homem e a mulher. Correto. Mas e os hermafroditas aqui mencionados por quem foram criados? A minhoca não é um ser divino por que ela possui óvulos e espermatozoides simultaneamente? E no ser humano? Os hermafroditas são aberrações? Mas aberrações criadas por quem? Pelo demônio? O demônio pode criar aberrações? Mas se o demônio pode criar aberrações, então quem garante que a própria criação do homem e da mulher não seja uma aberração criada pelo demônio? O demônio é astuto, certo? Seria muito mais fácil ele criar algo que "parecesse natural", como no caso do homem e da mulher e induzir a sociedade a erro do que criar algo que o processo ser humano considerasse uma aberração. Dessa maneira, o demônio seria burro, longe da esperteza, do ardil e da sagacidade que essas religiões falam que ele possui.

 Fica claro, portanto, que na natureza e na espécie humana não existe somente o dual: macho e fêmea, mas também seres híbridos que carregam características de ambos.

 4- A HOMOSSEXUALIDADE É UMA DOENÇA

 No dia 17 de maio de 1990, a OMS retirou a homossexualidade da lista de transtornos mentais. Antes disso, em 1973, a Associação Americana de Psiquiatria já havia retirado. Em 1975, a Associação Americana de Psicologia fez o mesmo. Em 1984, a Associação Brasileira de Psiquiatria rechaçou a discriminação contra homossexuais, alegando que tais indivíduos não são prejudiciais à sociedade, Em 1999, a Associação Brasileira de Psicologia proibiu qualquer terapia que prometa a cura ou o tratamento da homossexualidade. Por fim, em 1991, a Anistia Internacional passou a considerar a discriminação contra homossexuais uma violação aos direitos humanos.

 Dessa forma, fica claro que tanto do ponto de vista médico, quanto psicológico, a homossexualidade não é mais encarada como uma doença, desvio ou qualquer tipo de perversão. Ademais, sob o ponto de vista científico, algo para ser considerado uma doença deve:

 1- Trazer prejuízos físicos ao organismo da pessoa.
 2- Trazer prejuízos psicológicos, mentais, emocionais ao organismo da pessoa e a outrem.
 3- Trazer prejuízos físicos e psicológicos simultaneamente.

 A homossexualidade não traz nenhum prejuízo físico ao organismo de alguém. Ninguém adoece ou tem o funcionamento orgânico prejudicado por ser homossexual, tampouco morre, perde alguma capacidade físico-motora, etc.

 Os prejuízos psicológicos, mentais, emocionais que um homossexual pode apresentar são todos em função do preconceito pelo qual o tema ainda é tratado. É óbvio que se você cresce em um ambiente em que seus pais, amigos e familiares falam que a homossexualidade é algo errado, a forma de você lidar com isso será delicada. Se desde criança foi lhe ensinado que a homossexualidade é imoral, ainda que você pense o contrário, caso você seja homossexual, terá que lidar com os preconceitos da família. E caso a família aceite, a pessoa ainda poderá enfrentar os preconceitos da sociedade.

 Dessa maneira, fica claro que os desequilíbrios emocionais enfrentados por muitos homossexuais não são inerentes de um conflito emocional interno, mas de um conflito emocional, a priori, totalmente externo que pode se interiorizar, ou seja, o motivador (a causa inicial) para um possível conflito nunca é a própria pessoa em si, mas um agente externo a ela.

Crianças pequenas (de 2, 3, 4 anos) têm demonstrado, em pesquisas e experiências tolerância em relação à homossexualidade. O mesmo não ocorre depois dos 5, 6 anos, idade em que muitas dessas crianças já foram incutidas de que a homossexualidade é algo errado. Mais que isso, crianças que são ensinadas desde cedo que a homossexualidade é algo normal, moral tanto quanto a heterossexualidade dificilmente terão problemas em lidar com isso no dia a dia ao avistarem casais gays. Ao contrário, se desde a mais tenra infância, o indivíduo é ensinado que a homossexualidade é imoral, errada, ela tende a se espantar, chocar-se ou tornar-se intolerante ao avistar casais homossexuais. Essas questões não valem somente para o âmbito familiar, mas para o âmbito escolar e social dessas crianças.

Fica evidente que a homossexualidade não preenche nenhum dos critérios estabelecidos para que seja considerada uma doença, ao menos do ponto de vista científico.

 5- A HOMOSSEXUALIDADE É IMORAL. É UMA PERVERSÃO MORAL

 Julgar algo como sendo moral ou imoral é um campo de discussão interminável, em que enveredamos pela Filosofia (Ética), Sociologia, Historicismo, crenças religiosas, achismos, preferências pessoais, histórias de vida, etc. Sem querer entrar em discussões mais profundas acerca da moral, o que transformaria esse texto em um conto sem fim, procurarei demonstrar exemplos quase uníssonos do que seja considerado moral e imoral em nossa sociedade (falo da sociedade brasileira) pelo senso comum.

 MATAR ALGUÉM - Salvo em casos extremos de Legítima Defesa ou para ajudar outra pessoa em perigo, um familiar nas mãos de um bandido, por exemplo, o ato de matar é considerado imoral pela quase totalidade das pessoas consideradas sãs.

 ROUBAR OU FURTAR - Da mesma forma, roubar, salvo em casos de extrema necessidade - a pessoa rouba um pacote de biscoito porque tem fome - e furtar são ações consideradas imorais pela quase totalidade das pessoas consideradas sãs.

CORRUPÇÃO, ESTELIONATO, LAVAGEM DE DINHEIRO

 Agora podemos questionar o porquê de ações como matar, roubar, furtar, etc., serem consideradas imorais.

 Primeiramente, em uma sociedade sem conflitos extremos - guerra civil, grande parte da população sedenta e desnutrida - matar, roubar ou furtar gera um desequilíbrio, uma desarmonia não necessária para uma sociedade relativamente estável. Se alguém sai na rua e é roubado, outros poderão temer ser roubados também. Semelhantemente, se alguém é morto na rua, outros ficarão inseguros em sair de casa e serem mortos. Em todos esses casos, houve uma quebra de harmonia na sociedade. Não se pode legitimar um assassinato, salvo as exceções já apresentadas, como algo moral, pois caso isso ocorresse a sociedade entraria em colapso. Não haveria garantia nenhuma de harmonia social, pelo contrário, alguém poderia ser morto a qualquer hora e, já que a ação não seria passível de punição, outros poderiam matar ou serem mortos e não haveria mais harmonia social. O mesmo ocorreria com o caso do furto e de roubos. Importante salientar que, independente da crença religiosa, achismos, preferências pessoas, visões de mundo, etc., legitimar o ato de matar alguém ou roubar alguém, em nossa sociedade, como algo moral, arruinaria os pilares básicos de harmonia social, ou seja, não estamos falando de qualquer julgamento baseado em juízos de valores, crenças ou preferências, mas tão somente sobre questões consideradas imorais, pois prejudicariam o bem estar da nossa sociedade. A esse grupo de ações imorais, daremos o nome de ações imorais de fato.

 Contudo, a grande problemática do conceito de moral e imoral ocorre justamente em questões não consensuais em que os juízos de valor, crenças, conceitos e preconceitos entram em cena. Uma mulher com microvestido pode ser considerada imoral "de acordo com as leis da moral e dos bons costumes". Mas que leis morais e dos bons costumes são esses? Certamente não estão no mesmo nível das supracitadas, pois uma mulher de microvestido não causa nenhum desequilíbrio social de fato. Pode haver uma perturbação de outras pessoas, mas porque essas consideram que uma mulher de microvestido é algo imoral e não porque a mulher de microvestido vai causar desarmonia na sociedade, impossibilitando a mesma de se manter harmoniosa.

 Não existe simplesmente a "lei da moral e dos bons costumes". Isso foi algo inventado e apreendido pelos indivíduos da nossa sociedade, no máximo, a maioria chegou a um consenso sobre isso, mas ainda assim, um consenso que está longe de ser uníssono. Para um homem solteiro e que procura sexo, uma mulher de microvestido pode ser interessante e moral. E, caso ele venha a transar com a garota de microvestido em questão, o que isso atrapalhará a sociedade? Em nada, obviamente a não ser, novamente para os famigerados moralistas com a simples repetição de que "isso afronta a lei da moral e dos bons costumes". Mas mais uma vez me perguntou que lei é essa? De onde ela veio? No que ela contribui para a harmonia/desarmonia de uma sociedade?

 É exatamente nesse patamar que a homossexualidade entra. Quando alguém diz que a homossexualidade é imoral, essa pessoa está se baseando em crenças, juízos de valor, "lei da moral e dos bons costumes" e não na harmonia/desarmonia da nossa sociedade. Fica evidente que a homossexualidade, quando é considerada imoral, não entra no critério de ações imorais de fato. Nesse caso e o da mulher de microvestido, daremos o nome de "ações imorais baseadas em juízo de valor”.

A grande pergunta que fica em questão é se podemos cercear os direitos de pessoas - como a mulher usar o microvestido ou um casal homossexual não poder se casar - com base nas "ações imorais baseadas em juízo de valor." Mesmo porque, nesse caso, não existe um consenso. Muitos defenderão a liberdade da mulher em se vestir da forma que ela quiser, afinal vivemos em um país democrático. Da mesma maneira, muitos defenderão o casamento civil homossexual alegando que os homossexuais têm os mesmos direito dos heterossexuais. As ações imorais baseadas em juízo de valor nunca são uníssonas, pelo contrário, muitos defendem essas ações, não só como sendo morais, mas como imprescindíveis para um país democrático.

 Ademais, o fato de a mulher usar um microvestido, não impede que outras que não concordem usem vestidos mais longos, calças, etc., ou seja, o microvestido não tira o direito de outras mulheres. Da mesma forma, o fato de que um casal homossexual possa se casar, não tira o direito de casais heterossexuais também se casarem ou ainda de alguém que não é homossexual ser obrigado a se tornar um homossexual. Nesses casos, não existe cerceamento de direitos, pelo contrário, uma ampliação de direitos com base em conceitos democráticos. Não estamos falando aqui que as pessoas terão que concordar ou achar moral uma mulher ir às ruas de microvestido ou um casal homossexual poder se casar, o que falamos é que concordando ou não, tirar essa liberdade dessas pessoas soa antidemocrático e ditatorial.

 6- Conclusão:

 Uma vez que:

1- A homossexualidade não é antinatural;
2- na Bíblia, apesar de haver menções contra a homossexualidade, também há várias que os fiéis ignoram;
3 - Deus não ter criado somente Adão e Eva;
4- a homossexualidade não ser considerada uma doença;
5- a homossexualidade não ser uma ação imoral de fato;

 Que tipos de argumentos, para além dos preconceituosos, poderiam legitimar a não aprovação do casamento civil homossexual em nosso país?

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

A classe média que o governo inventou

O Censo 2010 mostrou que cerca de 60% da população brasileira tinha renda per capita de até um salário mínimo, donde depreende-se que a mediana brasileira para renda per capita era inferior a 510 reais, portanto, inferior a 1683 reais. (média domiciliar de 3,3 moradores segundo o último censo). Pegando os dados da FGV, temos que 66,8% das pessoas pertencem às classes A, B ou C e 33,2 às classes D e E. A classe C, sozinha, conta com 55% de membros.

"O IBGE divide as categorias das classes sociais de acordo com a renda familiar mensal. Estão na classe E as pessoas com renda de até R$ 751. Na classe D figuram as famílias que recebem entre R$ 751 e R$ 1.200 por mês.

A classe C é composta de famílias com renda entre R$ 1.200 e R$ 5.174. Já a classe B inclui pessoas com renda familiar entre R$ 5.174 e R$ 6.745. Qualquer família que ganhe mais do que isso por mês é considerada classe A pelo IBGE."

Na verdade, houve um erro de reportagem, pois não é o IBGE e sim a FGV. Continuemos... para 33,2% da população brasileira a renda não chega a 1.200 reais por mês, portanto, 363,6 per capita por mês. Temos portanto um grande bolo de quase 30% (para completar os 60% (60,7%) que vivem com até 1 salário mínimo per capita). Podemos afirmar, matematicamente, que a mediana brasileira per capita é superior a 363,6 reais e inferior a 510 reais. Logo, podemos afirmar que o grande bolo da classe C está entre 363,6 e 510 reais per capita por mês, portanto, seguramente entre os 1.200 a 1683 reais está a metade da fatia da classe C, ou seja, dos 55% pertencentes à classe C, 27,5% tem rendimento mensal inferior a um salário mínimo, juntando-se aos outros 33,2% e somando-se aos 27,5% (metade da classe C) temos 60,7%.

Já sabemos, portanto, que metade da classe C tem renda entre 1.200 e 1.683 reais. Continuemos com o cruzamento de dados. O Censo também divulgou que 82,4% dos brasileiros vivem com renda per capita de até 2 salários mínimos por mês, ou seja, 1020 reais.

Excluindo-se os já 60,7%, sobra 21,7% das pessoas nesse bolo. Novamente fazendo a média de moradores de 3,3, temos que 82,4% das famílias brasileiras tinha renda inferior a 3366 reais em 2010. Somando a 27,5% e adicionando-se, chegamos a conclusão de que 49,2% dos 55% dos membros pertencentes à classe C tinham renda inferior a 3366 reais por mês, donde conclui-se que o percentual de membros da classe C que ganha entre 3366 a 5100 (um abismo de 1743 reais) representa tão somente um pouco amis que 5% dos 55% dos brasileiros pertencentes à classe C. Possivelmente esses, aliados aos 11,8% das classes A e B completariam a verdadeira classe média brasileira, ou seja, algo proximo dos 17,6% da populaçao brasileira que ganha acima de 3366 reais. Reparem, mais uma vez como esses números são perigosos: eles forjam o grande hiato de 1743 reais que separa a classe C da classe B, em que estão apenas 5,8% dos brasileiros, digamos representando os tops da classe C. A partir da faixa de 5100 reais, chegamos à elite brasileira com os seus 11,8% de representantes. No entanto, como esse número já engloba a minoria, a renda vai caindo de maneira muito mais devagar... por exemplo para se pertencer ao top dos 1% mais ricos, estima-se que a renda necessária seja acima de 20 mil reais (uma diferença de cerca de 14 mil reais para se pertencer ao top 10), mostrando mais uma vez um hiato entre a elite e a "superelite", fazendo acreditar que a elite se veja como classe média. (No caso, isso serve para a maioria das pessoas aqui).

Em suma, temos uma manipulação de números convenientes ao governo para demonstrar um progresso não existente. Houve sim melhorias, mas muito inferiores àquelas que o governo quer propagar. Só aumentar em pouco mais de 400 reais a renda mínima para ser considerado classe C (ou seja 1.683 reais) e teríamos novamente um Brasil formado pela maioria nas classes D e E.

OBS: Mediana leva em consideração o bottom 50% e o top 50%, desconsiderando-se a média.
Vamos dar um exemplo: em um país de 6 famílias cuja renda de cada família é de 1.000, 2.000, 3.000, 6.000 8.000 mi e 10 mil, teríamos a média de renda em 30 mil dividida por 6, ou seja, renda média de 5 mil. No entanto, a mediana seria acima de 3000 reais (um desvio de 2000 reais), uma vez que o bottom 50% seriam as três famílias que ganham 1.000, 2.000 e 3.000 e o top 50% seriam as famílias que ganham acima de 3.000 reais. Portanto a mediana serve para minimizar a média que é forjada devido às disparidades salariais. Na verdade, o cálculo da mediana é um pouco mais complicado, mas para efeitos de esclarecimento, o mais importante é a visualização entre os 50% de baixo e os 50% de cima

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Renda per capita brasileira atinge quase 11 mil dólares, mas população não vê isso

Com o crescimento de 7,5% da economia brasileira em 2010 e a desvalorização do dólar ante ao real, a renda per capita brasileira atingiu os US$ 10.814 dólares anuais ou cerca de R$ 19.000. Caso essa renda fosse distribuída de maneira igualitária entre todos os brasileiros - incluindo crianças e adolescentes - a renda per capita mensal de cada habitante seria de 1.461 reais (incluindo o 13o salário). Para uma família de três pessoas, a renda seria de 4383 reais mensais.

Infelizmente, o crescimento econômico brasileiro, embora tenha beneficiado razoavelmente a população, ainda esbarra na enorme desigualdade de renda do país. Ainda que a concentração de renda, no Brasil, esteja caindo, essa queda é muito paulatina, discreta e aquém do que deveria ser. Para efeitos de comparação, o último censo de 2010 constatou que 82,4% da população brasileira vivia com menos de 2 salários mínimos (1.020 reais na época) de renda per capita mensal, ou seja, pelo menos 8 de 10 brasileiros estavam abaixo da renda per capita média do país. Na outra ponta famílias com renda per capita mensal acima de 3 salários mínimos (1530 reais) representavam apenas 10,45%. Enquanto os lares que possuíam renda per capita mensal entre 2 e 3 salários mínimos, ou seja, próximos da média, era de 7,15%.

Dessa forma, percebe-se que a renda per capita de 10.800 dólares é irreal no que diz respeito à realidade social da população, uma vez que 82,4% dos lares brasileiros estavam abaixo da média, 7,15% dentro da média e apenas 10,45% acima dela. Fica difícil, quando se fala da população em si e não da renda do país, considerar os 10.800 dólares como um fator confiável para se medir o Índice de Desenvolvimento Humano do Brasil. Na verdade, a renda per capita média dos brasileiros é, ao menos a metade (algo entre 5.000 a 5.500 dólares anuais).

Um dado animador divulgado pela Fundação Getúlio Vargas demonstra que a concentração de renda no Brasil caiu para valores ligeiramente abaixo daqueles da década de 60 (década em que o Brasil apresentou a menor concentração de renda até então). O crescimento da renda da fatia mais desfavorecida, bem como a de negros e analfabetos vem aumentado bem mais do que a média. Contudo, ainda que a concentração de renda no Brasil esteja caindo e a renda da população pobre esteja aumentando, a situação do país ainda é preocupante e ultrajante. Muito se fala que as mudanças devem ser paulatinas a fim de se consolidarem. Mas de tão paulatinas o Brasil tem ficado para trás. Em 1960, a renda per capita brasileira era ligeiramente acima da sul-coreana. Hoje, a Coreia do Sul ostenta uma renda per capita duas vezes e meia acima da brasileira. Outros países, como o Japão, passaram por mudanças radicais nos últimos 50 anos. O que ocorre no Brasil? Por que, embora esteja avançando discretamente as mudanças no país são tão vagarosas, lentas, beirando a inércia?

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Dados do Censo 2010 sobre alfabetização

Aqui estão os dados percentuais decrescentes da alfabetização por estados, segundo o último censo do IBGE de 2010. Os dados foram divulgados em 29 de abril de 2011 e mostram uma enorme disparidade entre os estados brasileiros:


DF 96,7%

SC 96,1%

RJ e SP 95,9%

RS 95,6%

PR 94,2%

MS 92,9%

GO 92,6%

ES 92,4%

MG 92,3%

AP e MT 92,1%

RO 92%

Brasil 90,4%

AM e RR 90,3%

PA 88,7%

TO 88,1%

AC 84,8%

BA 84,6%

PE 83,2%

SE 83%

CE 82,8%

RN 82,6%

MA 80,6%

PB 79,7%

PI 78,8%

AL 77,4%

sábado, 30 de abril de 2011

Resultados do Censo 2010 do IBGE azedam a pizza brasileira




E no final, tudo vai terminar bem. E no final, tudo termina em pizza. A tão proclamada pizza, que para alguns é saborosa e para outros definitivamente não, iguaria icônica como ela só para representar a “cordialidade brasileira”, parece ter azedado. Não foi dessa vez que a pizza deu o ar da alegria e do terminar bem. Mas será que todos concordam com o final triste? Bom, o censo de 2010 balança a cabeça com o sim. Pertinente mesmo recorrer a essa metonímia, porque não é alguém que concorda, é “o censo”. Mas, longe de mim ficar em cima do muro, pego a metonímia e personifico-a: penso SIM que a pizza tá com um gosto horrível. Pergunto novamente: será que todos concordam?

De 2000 (ano do penúltimo censo) até 2010 o Brasil passou por uma suposta revolução política. Eis que finalmente, em 2002, um partido, até então de esquerda, assume o poder. Sai um sociólogo, de linguajar refinado e pomposo e entra um “lula do povo”. Eu já questionava o fato de a lula ser realmente um alimento do povo. Eu pensava que era a tal pizza ou seria o frango? Entretanto, essa lula era especial: não vinha do mar, era da terra. Além disso, falava, esbravejava, dizia-se popular, quiçá pensava. Daí que caiu na graça do povo. Pena que o alimento se personificou – nem pôde, com isso, matar a fome dos mais pobres –. Atendia agora pelo L maiúsculo: era Lula e não mais lula. E, provando que não era homofóbico, tampouco conservador, mudou de sexo: o Lula e não mais a lula.

Os projetos políticos, já do Lula personificado, eram audaciosos. No final de seu governo, todos teriam um prato de comida à mesa. Fome Zero. A ideia foi logo abandonada, ou melhor, reformulada para o Bolsa Família. Juntando uma migalha do bolsa escola, do bolsa gás e de tantas outras (por isso 4 milhões a mais de mulheres nesse país, é muita bolsa) o presidente, com toda a sua equipe, deu um passo social importantíssimo para o nosso país: a quantidade traduzida em números estupendos. Já não importava mais o que era ou como funciona o programa, mas sim a divulgação de quanto se gastava e de quantos brasileiros estavam sendo beneficiados. Embalado por esse frenesi quantitativo, Lula e sua equipe criaram o Pro-Uni e o Pro-Jovem. Afinal, o Brasil é um país de todos. Precisamos de pessoas na faculdade. Precisamos de pessoas analfabetas sendo alfabetizadas. Precisamos de pessoas que não terminaram o primeiro grau para concluírem-no. Precisamos de pessoas porque elas fazem números. E números grandes são bonitos de ser mostrados à população.

Tiro saiu pela culatra. Melou. Babou. E foi fogo amigo: o censo. Eis que ele – o implacável censo – despertou a fúria de números latentes, revoltados, rebeldes, que se manifestaram e se voltaram contra o governo. Se, desde o último censo até então, o de 2000, para o de 2010 passaram-se dez anos, oito foram sob a égide do “Lula do povo”. Tanto progresso em oito anos. O Brasil se tornou respeitado lá fora, a classe média passou a ser a maioria no país, a lula – alimento – conquistou a popularidade, milhares de brasileiros entraram na faculdade e foram alfabetizados pelos programas sociais do governo. Números, números. Mas os revoltosos não aguentaram: vieram à tona. Se eu dissesse que 60% dos domicílios brasileiros têm renda per capita mensal de até um salário mínimo, vocês acreditariam no poder da “nova classe média? E se eu completasse essa informação acrescentando mais quinhentinhos reais e falasse que esse número subiria para 82,4% dos lares brasileiros? Ah sim, desculpe-me, esqueci-me dos dez reais que faltavam. Eles são para comprar a lula. O quê? Os 510 reais são o bruto e não o líquido? Não vai sobrar dinheiro para a lula? Não importa, afinal o que conta é o bruto mesmo, né? Que se parcele a minha lula no cartão e mês que vem eu pago! Anota aí, que eu vou parcelar a minha compra! O quê? Você não sabe escrever? Tá bom, você nem é um alienígena. São 9,6% de analfabetos, no Nordeste quase 20%. Mas é claro que vários jovens foram alfabetizados, o problema são os aposentados vagabundos que não querem voltar a trabalhar, tampouco estudar. Vão para a escola e aprendam a ler para diminuir a taxa de analfabetismo do Brasil!

Como o novo governo – continuação do antigo – vai solucionar esse pepino? Pois agora os números revoltosos não estão a favor. Talvez seja melhor falar de Copa do Mundo e Olimpíadas, afinal quem se importa com esses problemas sociais? Aquele governo longínquo já tinha feito isso, não é mesmo? Se a crise é mundial, vamos dar o nosso capital? Vendamos tudo. Deixa o povo protestar com as privatizações. Dos males o menor. Não vão nem perceber o pífio crescimento de 98 e 99, pelo contrário, vão estar mais preocupados em não perder o emprego, já que agora grande parte das empresas é particular e não mais pública. Problema resolvido. Só recorrer à história recente do país. E vamos combinar que falar sobre Copa do Mundo e Olimpíadas é muito mais prazeroso do que privatizar empresas e aumentar o desemprego, né? Números revoltosos, definitivamente vocês foram debelados! Para requintar o circo com pão, eis que aumentemos os benefícios do Bolsa Família. Pronto, demos circo, pão e mantega, ops, manteiga. Podemos até chamar os injustiçados do mensalão de volta, ninguém vai protestar: hein, Delúbio, por onde você anda? Volta para cá, amigo!

Graças a Deus, eu nunca fui chegado a um circo. Gosto – e acredito nos números revoltosos – eu sou uma resistência que ainda não findou. Não quero ser estraga prazeres, mas eu quero mesmo que essa pizza azede bastante. E muito. Talvez assim haja mais números revoltosos que, ao menos com alguma dignidade, ainda achem um descalabro a volta do Delúbio Soares. E venham mais números rebeldes para não aceitar que o ex-presidente do Senado, Renan Calheiros, que renunciou ao cargo em meio a escândalos de corrupção, torne-se agora membro do Conselho de Ética do Senado. Isso é sim muita falta de ética. Talvez para esses tais, a pizza não azedou mesmo. Mas para a maioria ela está estragada. O pior é que a maior parte não sabe. Ah, e a tal lula popular que trocou de sexo, passando a ser atendida no masculino e com o L maiúsculo não provou ser anti-homofóbico. O projeto de lei que tramita no parlamento tá lá, quietinho. Mas tá tudo bem. Se o censo azedou a pizza para os mais conscientes, é só reinventar o pão com circo, aprimorá-lo, modernizá-lo. Afinal, né brasileiros, a pizza pode estar amarga, mas se o pãozinho for gostoso e ainda estiver com manteiga para que brigar? Eis a nossa distinção, o nosso charme – a nossa cordialidade.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Programa de Transferência de Renda: Bolsa Família e Food Stamps

Assistencialistas, Políticos, Necessários?



1- Os programas

Cerca de 11 milhões de famílias, em média 35 milhões de brasileiros, são beneficiados pelo programa Bolsa Família, um dos maiores programas de transferência de renda da atualidade, encontrando talvez apenas o americano Supplemental Nutrition Assistance Program (SNAP) como concorrente ao título. O “Food Stamps”, como é popularmente conhecido nos EUA, abrange em torno de 40 milhões de famílias.

O projeto do Bolsa Família nasceu da integração de alguns programas já existentes no governo FHC: bolsa-escola, bolsa gás e outros. Todos esses auxílios foram incorporados e melhor estruturados pelo projeto do Bolsa Família, que veio para substituir um outro projeto, o Fome Zero. Em um primeiro instante, de caráter assistencialista e emergencial, o programa visa a tirar as famílias consideradas extremamente pobres (menos de 70 reais per capita por mês) e pobres (até 140 reais per capita por mês) da situação de penúria, proporcionando condições mínimas para a sobrevivência. Mais importante, contudo, é a necessidade de os beneficiados preencherem alguns pré-requisitos: os filhos estarem regularmente matriculados na escola e com a carteira de vacinação em dia. A transferência de renda do programa varia conforme a renda per capita da família e o número de filhos, sendo o mínimo de 22 e o máximo de 200 reais de auxílio.

O “Food Stamps” americano segue um padrão bem parecido com o brasileiro. A criação do programa data de 1939 e é creditada ao Ministro da Agricultura da época Henry Wallace. O administrador do auxílio era Milo Perkins. Na época o programa funcionava da seguinte forma: os selos laranja indicavam que a pessoa poderia comprar os produtos a custo de produção. A cada um dólar que era gasto no selo laranja, 0,50 centavos de dólares de beneficio eram dados aos beneficiados. Com o selo laranja podia-se comprar qualquer comida, o selo azul permitia apenas uma lista prévia elaborada pelo governo. Dessa forma, o “Food Stamps”, tornou-se um dos primeiros programas de auxílio de transferência do mundo. Ao longo dos anos, o programa passou por várias reformas. Atualmente, existem várias concessões: imigrantes ilegais, por exemplo, não tem direito ao auxílio. Em termos monetários, o Food Stamps americano estabelece uma linha mínima de pobreza, proporcionando benefícios, em média, de 133 dólares por pessoa.

Dados:

Bolsa Família:

Abrangência: Cerca de 35 milhões de pessoas.
Benefícios: De 22 a 200 reais.
Gastos do governo com o programa: 13,4 bilhões de reais (projetado para 2011)

Food Stamps:

Abrangência: Cerca de 40 milhões de pessoas.
Benefícios: Média de 133 dólares por pessoa, chegando até a 650 dólares para uma família dependendo das condições
Gastos do governo com o programa: 56 bilhões de dólares (dados de 2006)


2- Reflexões sobre os programas



O que se pode perceber de antemão é o maior gasto e maiores benefícios do programa americano em relação ao brasileiro. Isso, contudo, não significa maior eficácia do primeiro sobre o segundo. Há de se ressaltar o custo de vida americano e o padrão do que é ser pobre no país, um limite bem superior ao brasileiro. Segundo a maioria das classificações, pobre nos EUA são famílias de quatro pessoas com renda anual inferior a 22 mil dólares, cerca de 37.500 reais por ano, ou 3125 reais por mês, sem contar o 13º salário. No Brasil, a linha de pobreza é de 255 reais per capita por mês, ou 1.020 reais para quatro pessoas e 12.240 reais por ano. Dessa forma, percebemos, na média, que a linha de pobreza americana é até três vezes superior à brasileira. Cabe enfatizar, mais uma vez, o fato de o custo de vida nos EUA ser mais alto, portanto haver a necessidade do PPC (poder de paridade de compra).

Em relação às críticas os dois programas se assemelham: ambos são tidos como “instigantes à vagabundagem” ou assistencialistas. No caso americano, no entanto, o Food Stamps parece ter um peso político muito menor que o Bolsa Família brasileiro. Nos debates presidentes, por exemplo, quase não se fala do Food Stamps e ele é pouco usado como manobra eleitoral, talvez porque ele seja muito mais antigo em comparação ao auxílio brasileiro e, portanto, já enraizado como parte do cotidiano do cidadão americano de baixa renda. O Bolsa Família, todavia, é bem recente (2003) e é usado fortemente na esfera política, tanto de maneira positiva, quando de maneira negativa. Os contrários ao programa falam que, além de assistencialista, o auxílio é usado politicamente, tanto para divulgar as melhorias que o governo está fazendo, quanto para ganhar suporte eleitoral dos privilegiados pelo programa. Alguns vão além e dizem que o programa se tornou o “voto de cabresto” moderno.

Esse racha gerou calorosos debates entre os brasileiros. Os contrários diziam que o governo só faria o sucessor devido ao programa, enquanto os defensores diziam que ele era necessário para prover as famílias do mínimo necessário. Houve uma grande divisão entre regiões mais pobres e, consequentemente, onde há um maior número de beneficiados, e as regiões mais ricas onde há menos contemplados . Muitos argumentos usados pelos detratores se demonstraram falaciosos: mesmo sem o Norte e o Nordeste a candidata da situação teria vencido.

Além disso, parece existir um esquecimento por parte dos críticos de que, como já mostrado, os programas de transferência de renda existem em vários outros lugares (África do Sul, México, Chile e a cidade de Nova York, com o Opportunity NYC) demonstraram interesse em se inspirar no Bolsa Família. Outros países, como o próprio EUA, Canadá, Noruega, Suécia, França,etc, já adotam auxílios monetários há décadas. E mais: com auxílios até maiores e, em um primeiro instante, com um caráter assistencialista até maior. É preciso lembrar que para se receber o Bolsa Família as crianças devem estar matriculadas nas escolas. Sendo assim, não se pode falar tão somente em um programa assistencialista, mas também em um programa que visa à melhoria dos níveis de educação básicos do país, pelo menos no aspecto quantitativo, já que no qualitativo realmente o programa em nada contribui.

Talvez, uma das alternativas para “despolitizar” o Bolsa Família seria colocá-lo na Constituição Brasileira, pois dessa forma se tornaria uma lei e o programa não poderia acabar, caso outro governo assumisse a presidência. O auxílio de um salário mínimo às pessoas com mais de 65 anos que não tem renda não é usado de forma política, justamente por já fazer parte da Constituição. Dessa forma, não adianta alguém falar que o programa será usado de “forma política”, pois se é lei, para ser mudado, precisaria de aval do Congresso e isso geraria um menor temor dos possíveis eleitores que votam a favor do governo com medo de a oposição acabar com o auxílio, caso vença.

Ademais, argumentar que o programa gera uma “acomodação” por parte dos beneficiados parece um tanto frágil. Primeiramente porque se não houver nenhum tipo de ajuda como essas pessoas poderão, ao menos colocar os filhos na escola? Não estamos falando de pessoas de classe baixa, mas de pessoas de classe baixíssima, que muitas vezes não tem dinheiro para o transporte. Sem ajuda, menos dinheiro, com menos dinheiro mais limitação ainda para essas pessoas. É fácil, em teoria, dizer que todos podem estudar e vencer na vida, mas, como o velho clichê já dizia e é importante enfatizar: como uma pessoa preocupar-se-á com o estudo se não tem o mínimo das necessidades básicas atendidas? E como dizer que a educação é a solução de tudo se o povo tem fome? Ninguém vai esperar onze anos para terminar o Ensino Médio e poder comer decentemente. A comida é diária. A necessidade de nutrição e de dignidade também. Por isso, muito mais do que acabar com o programa ou chamá-lo de assistencialista, ele deveria ser ampliado, englobando uma parcela maior da população.

domingo, 7 de novembro de 2010

Não percam! Amanhã matéria nova no Blog sobre o programa de transferência de renda Food Stamps americano, e outros no mundo, em comparação com o Bolsa-Família. Amanhã a matéria estará disponível aqui!

Além disso, estamos preparando novidades para o blog com a participação de novos colaboradores. Muitas novidades estão por vir!

Não deixem de acessar a enquete e participar do blog. Nós queremos ouvi-lo e nós queremos fazer um blog ainda melhor para vocês!