quinta-feira, 11 de agosto de 2011

A classe média que o governo inventou

O Censo 2010 mostrou que cerca de 60% da população brasileira tinha renda per capita de até um salário mínimo, donde depreende-se que a mediana brasileira para renda per capita era inferior a 510 reais, portanto, inferior a 1683 reais. (média domiciliar de 3,3 moradores segundo o último censo). Pegando os dados da FGV, temos que 66,8% das pessoas pertencem às classes A, B ou C e 33,2 às classes D e E. A classe C, sozinha, conta com 55% de membros.

"O IBGE divide as categorias das classes sociais de acordo com a renda familiar mensal. Estão na classe E as pessoas com renda de até R$ 751. Na classe D figuram as famílias que recebem entre R$ 751 e R$ 1.200 por mês.

A classe C é composta de famílias com renda entre R$ 1.200 e R$ 5.174. Já a classe B inclui pessoas com renda familiar entre R$ 5.174 e R$ 6.745. Qualquer família que ganhe mais do que isso por mês é considerada classe A pelo IBGE."

Na verdade, houve um erro de reportagem, pois não é o IBGE e sim a FGV. Continuemos... para 33,2% da população brasileira a renda não chega a 1.200 reais por mês, portanto, 363,6 per capita por mês. Temos portanto um grande bolo de quase 30% (para completar os 60% (60,7%) que vivem com até 1 salário mínimo per capita). Podemos afirmar, matematicamente, que a mediana brasileira per capita é superior a 363,6 reais e inferior a 510 reais. Logo, podemos afirmar que o grande bolo da classe C está entre 363,6 e 510 reais per capita por mês, portanto, seguramente entre os 1.200 a 1683 reais está a metade da fatia da classe C, ou seja, dos 55% pertencentes à classe C, 27,5% tem rendimento mensal inferior a um salário mínimo, juntando-se aos outros 33,2% e somando-se aos 27,5% (metade da classe C) temos 60,7%.

Já sabemos, portanto, que metade da classe C tem renda entre 1.200 e 1.683 reais. Continuemos com o cruzamento de dados. O Censo também divulgou que 82,4% dos brasileiros vivem com renda per capita de até 2 salários mínimos por mês, ou seja, 1020 reais.

Excluindo-se os já 60,7%, sobra 21,7% das pessoas nesse bolo. Novamente fazendo a média de moradores de 3,3, temos que 82,4% das famílias brasileiras tinha renda inferior a 3366 reais em 2010. Somando a 27,5% e adicionando-se, chegamos a conclusão de que 49,2% dos 55% dos membros pertencentes à classe C tinham renda inferior a 3366 reais por mês, donde conclui-se que o percentual de membros da classe C que ganha entre 3366 a 5100 (um abismo de 1743 reais) representa tão somente um pouco amis que 5% dos 55% dos brasileiros pertencentes à classe C. Possivelmente esses, aliados aos 11,8% das classes A e B completariam a verdadeira classe média brasileira, ou seja, algo proximo dos 17,6% da populaçao brasileira que ganha acima de 3366 reais. Reparem, mais uma vez como esses números são perigosos: eles forjam o grande hiato de 1743 reais que separa a classe C da classe B, em que estão apenas 5,8% dos brasileiros, digamos representando os tops da classe C. A partir da faixa de 5100 reais, chegamos à elite brasileira com os seus 11,8% de representantes. No entanto, como esse número já engloba a minoria, a renda vai caindo de maneira muito mais devagar... por exemplo para se pertencer ao top dos 1% mais ricos, estima-se que a renda necessária seja acima de 20 mil reais (uma diferença de cerca de 14 mil reais para se pertencer ao top 10), mostrando mais uma vez um hiato entre a elite e a "superelite", fazendo acreditar que a elite se veja como classe média. (No caso, isso serve para a maioria das pessoas aqui).

Em suma, temos uma manipulação de números convenientes ao governo para demonstrar um progresso não existente. Houve sim melhorias, mas muito inferiores àquelas que o governo quer propagar. Só aumentar em pouco mais de 400 reais a renda mínima para ser considerado classe C (ou seja 1.683 reais) e teríamos novamente um Brasil formado pela maioria nas classes D e E.

OBS: Mediana leva em consideração o bottom 50% e o top 50%, desconsiderando-se a média.
Vamos dar um exemplo: em um país de 6 famílias cuja renda de cada família é de 1.000, 2.000, 3.000, 6.000 8.000 mi e 10 mil, teríamos a média de renda em 30 mil dividida por 6, ou seja, renda média de 5 mil. No entanto, a mediana seria acima de 3000 reais (um desvio de 2000 reais), uma vez que o bottom 50% seriam as três famílias que ganham 1.000, 2.000 e 3.000 e o top 50% seriam as famílias que ganham acima de 3.000 reais. Portanto a mediana serve para minimizar a média que é forjada devido às disparidades salariais. Na verdade, o cálculo da mediana é um pouco mais complicado, mas para efeitos de esclarecimento, o mais importante é a visualização entre os 50% de baixo e os 50% de cima

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Renda per capita brasileira atinge quase 11 mil dólares, mas população não vê isso

Com o crescimento de 7,5% da economia brasileira em 2010 e a desvalorização do dólar ante ao real, a renda per capita brasileira atingiu os US$ 10.814 dólares anuais ou cerca de R$ 19.000. Caso essa renda fosse distribuída de maneira igualitária entre todos os brasileiros - incluindo crianças e adolescentes - a renda per capita mensal de cada habitante seria de 1.461 reais (incluindo o 13o salário). Para uma família de três pessoas, a renda seria de 4383 reais mensais.

Infelizmente, o crescimento econômico brasileiro, embora tenha beneficiado razoavelmente a população, ainda esbarra na enorme desigualdade de renda do país. Ainda que a concentração de renda, no Brasil, esteja caindo, essa queda é muito paulatina, discreta e aquém do que deveria ser. Para efeitos de comparação, o último censo de 2010 constatou que 82,4% da população brasileira vivia com menos de 2 salários mínimos (1.020 reais na época) de renda per capita mensal, ou seja, pelo menos 8 de 10 brasileiros estavam abaixo da renda per capita média do país. Na outra ponta famílias com renda per capita mensal acima de 3 salários mínimos (1530 reais) representavam apenas 10,45%. Enquanto os lares que possuíam renda per capita mensal entre 2 e 3 salários mínimos, ou seja, próximos da média, era de 7,15%.

Dessa forma, percebe-se que a renda per capita de 10.800 dólares é irreal no que diz respeito à realidade social da população, uma vez que 82,4% dos lares brasileiros estavam abaixo da média, 7,15% dentro da média e apenas 10,45% acima dela. Fica difícil, quando se fala da população em si e não da renda do país, considerar os 10.800 dólares como um fator confiável para se medir o Índice de Desenvolvimento Humano do Brasil. Na verdade, a renda per capita média dos brasileiros é, ao menos a metade (algo entre 5.000 a 5.500 dólares anuais).

Um dado animador divulgado pela Fundação Getúlio Vargas demonstra que a concentração de renda no Brasil caiu para valores ligeiramente abaixo daqueles da década de 60 (década em que o Brasil apresentou a menor concentração de renda até então). O crescimento da renda da fatia mais desfavorecida, bem como a de negros e analfabetos vem aumentado bem mais do que a média. Contudo, ainda que a concentração de renda no Brasil esteja caindo e a renda da população pobre esteja aumentando, a situação do país ainda é preocupante e ultrajante. Muito se fala que as mudanças devem ser paulatinas a fim de se consolidarem. Mas de tão paulatinas o Brasil tem ficado para trás. Em 1960, a renda per capita brasileira era ligeiramente acima da sul-coreana. Hoje, a Coreia do Sul ostenta uma renda per capita duas vezes e meia acima da brasileira. Outros países, como o Japão, passaram por mudanças radicais nos últimos 50 anos. O que ocorre no Brasil? Por que, embora esteja avançando discretamente as mudanças no país são tão vagarosas, lentas, beirando a inércia?

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Dados do Censo 2010 sobre alfabetização

Aqui estão os dados percentuais decrescentes da alfabetização por estados, segundo o último censo do IBGE de 2010. Os dados foram divulgados em 29 de abril de 2011 e mostram uma enorme disparidade entre os estados brasileiros:


DF 96,7%

SC 96,1%

RJ e SP 95,9%

RS 95,6%

PR 94,2%

MS 92,9%

GO 92,6%

ES 92,4%

MG 92,3%

AP e MT 92,1%

RO 92%

Brasil 90,4%

AM e RR 90,3%

PA 88,7%

TO 88,1%

AC 84,8%

BA 84,6%

PE 83,2%

SE 83%

CE 82,8%

RN 82,6%

MA 80,6%

PB 79,7%

PI 78,8%

AL 77,4%

sábado, 30 de abril de 2011

Resultados do Censo 2010 do IBGE azedam a pizza brasileira




E no final, tudo vai terminar bem. E no final, tudo termina em pizza. A tão proclamada pizza, que para alguns é saborosa e para outros definitivamente não, iguaria icônica como ela só para representar a “cordialidade brasileira”, parece ter azedado. Não foi dessa vez que a pizza deu o ar da alegria e do terminar bem. Mas será que todos concordam com o final triste? Bom, o censo de 2010 balança a cabeça com o sim. Pertinente mesmo recorrer a essa metonímia, porque não é alguém que concorda, é “o censo”. Mas, longe de mim ficar em cima do muro, pego a metonímia e personifico-a: penso SIM que a pizza tá com um gosto horrível. Pergunto novamente: será que todos concordam?

De 2000 (ano do penúltimo censo) até 2010 o Brasil passou por uma suposta revolução política. Eis que finalmente, em 2002, um partido, até então de esquerda, assume o poder. Sai um sociólogo, de linguajar refinado e pomposo e entra um “lula do povo”. Eu já questionava o fato de a lula ser realmente um alimento do povo. Eu pensava que era a tal pizza ou seria o frango? Entretanto, essa lula era especial: não vinha do mar, era da terra. Além disso, falava, esbravejava, dizia-se popular, quiçá pensava. Daí que caiu na graça do povo. Pena que o alimento se personificou – nem pôde, com isso, matar a fome dos mais pobres –. Atendia agora pelo L maiúsculo: era Lula e não mais lula. E, provando que não era homofóbico, tampouco conservador, mudou de sexo: o Lula e não mais a lula.

Os projetos políticos, já do Lula personificado, eram audaciosos. No final de seu governo, todos teriam um prato de comida à mesa. Fome Zero. A ideia foi logo abandonada, ou melhor, reformulada para o Bolsa Família. Juntando uma migalha do bolsa escola, do bolsa gás e de tantas outras (por isso 4 milhões a mais de mulheres nesse país, é muita bolsa) o presidente, com toda a sua equipe, deu um passo social importantíssimo para o nosso país: a quantidade traduzida em números estupendos. Já não importava mais o que era ou como funciona o programa, mas sim a divulgação de quanto se gastava e de quantos brasileiros estavam sendo beneficiados. Embalado por esse frenesi quantitativo, Lula e sua equipe criaram o Pro-Uni e o Pro-Jovem. Afinal, o Brasil é um país de todos. Precisamos de pessoas na faculdade. Precisamos de pessoas analfabetas sendo alfabetizadas. Precisamos de pessoas que não terminaram o primeiro grau para concluírem-no. Precisamos de pessoas porque elas fazem números. E números grandes são bonitos de ser mostrados à população.

Tiro saiu pela culatra. Melou. Babou. E foi fogo amigo: o censo. Eis que ele – o implacável censo – despertou a fúria de números latentes, revoltados, rebeldes, que se manifestaram e se voltaram contra o governo. Se, desde o último censo até então, o de 2000, para o de 2010 passaram-se dez anos, oito foram sob a égide do “Lula do povo”. Tanto progresso em oito anos. O Brasil se tornou respeitado lá fora, a classe média passou a ser a maioria no país, a lula – alimento – conquistou a popularidade, milhares de brasileiros entraram na faculdade e foram alfabetizados pelos programas sociais do governo. Números, números. Mas os revoltosos não aguentaram: vieram à tona. Se eu dissesse que 60% dos domicílios brasileiros têm renda per capita mensal de até um salário mínimo, vocês acreditariam no poder da “nova classe média? E se eu completasse essa informação acrescentando mais quinhentinhos reais e falasse que esse número subiria para 82,4% dos lares brasileiros? Ah sim, desculpe-me, esqueci-me dos dez reais que faltavam. Eles são para comprar a lula. O quê? Os 510 reais são o bruto e não o líquido? Não vai sobrar dinheiro para a lula? Não importa, afinal o que conta é o bruto mesmo, né? Que se parcele a minha lula no cartão e mês que vem eu pago! Anota aí, que eu vou parcelar a minha compra! O quê? Você não sabe escrever? Tá bom, você nem é um alienígena. São 9,6% de analfabetos, no Nordeste quase 20%. Mas é claro que vários jovens foram alfabetizados, o problema são os aposentados vagabundos que não querem voltar a trabalhar, tampouco estudar. Vão para a escola e aprendam a ler para diminuir a taxa de analfabetismo do Brasil!

Como o novo governo – continuação do antigo – vai solucionar esse pepino? Pois agora os números revoltosos não estão a favor. Talvez seja melhor falar de Copa do Mundo e Olimpíadas, afinal quem se importa com esses problemas sociais? Aquele governo longínquo já tinha feito isso, não é mesmo? Se a crise é mundial, vamos dar o nosso capital? Vendamos tudo. Deixa o povo protestar com as privatizações. Dos males o menor. Não vão nem perceber o pífio crescimento de 98 e 99, pelo contrário, vão estar mais preocupados em não perder o emprego, já que agora grande parte das empresas é particular e não mais pública. Problema resolvido. Só recorrer à história recente do país. E vamos combinar que falar sobre Copa do Mundo e Olimpíadas é muito mais prazeroso do que privatizar empresas e aumentar o desemprego, né? Números revoltosos, definitivamente vocês foram debelados! Para requintar o circo com pão, eis que aumentemos os benefícios do Bolsa Família. Pronto, demos circo, pão e mantega, ops, manteiga. Podemos até chamar os injustiçados do mensalão de volta, ninguém vai protestar: hein, Delúbio, por onde você anda? Volta para cá, amigo!

Graças a Deus, eu nunca fui chegado a um circo. Gosto – e acredito nos números revoltosos – eu sou uma resistência que ainda não findou. Não quero ser estraga prazeres, mas eu quero mesmo que essa pizza azede bastante. E muito. Talvez assim haja mais números revoltosos que, ao menos com alguma dignidade, ainda achem um descalabro a volta do Delúbio Soares. E venham mais números rebeldes para não aceitar que o ex-presidente do Senado, Renan Calheiros, que renunciou ao cargo em meio a escândalos de corrupção, torne-se agora membro do Conselho de Ética do Senado. Isso é sim muita falta de ética. Talvez para esses tais, a pizza não azedou mesmo. Mas para a maioria ela está estragada. O pior é que a maior parte não sabe. Ah, e a tal lula popular que trocou de sexo, passando a ser atendida no masculino e com o L maiúsculo não provou ser anti-homofóbico. O projeto de lei que tramita no parlamento tá lá, quietinho. Mas tá tudo bem. Se o censo azedou a pizza para os mais conscientes, é só reinventar o pão com circo, aprimorá-lo, modernizá-lo. Afinal, né brasileiros, a pizza pode estar amarga, mas se o pãozinho for gostoso e ainda estiver com manteiga para que brigar? Eis a nossa distinção, o nosso charme – a nossa cordialidade.