sexta-feira, 29 de março de 2013

OS PSEUDO-ARGUMENTOS UTILIZADOS POR QUEM É CONTRA O CASAMENTO CIVIL HOMOSSEXUAL





 1- A HOMOSSEXUALIDADE NÃO É NATURAL.

Primeiramente, o que é natural? Em um sentido básico natural é aquilo que vem da natureza, que é próprio dela e que é regido pelas leis naturais. O ser humano é uma construção antropológica complexa que engloba o natural e o cultural. Somos os únicos animais que utilizamos roupas para nos cobrirmos, algo que não é natural, mas cultural. Assim que nascemos - nus - nosso cordão umbilical é cortado e colocam-nos uma toalha, logo depois uma vestimenta. A partir de tal episódio, imiscuir-se a cultura à natureza.

Outros exemplos clássicos de como a nossa cultura interfere no nosso modo de vida, afastando-nos de um caráter "natural" ou simplesmente ratificando o fato de sermos uma mescla entre o cultural e o natural, é o fato de nos depilarmos. Nenhum outro animal se depila. Da mesma forma não existe distinção - a não ser a biológica - entre machos e fêmeas em uma espécie. O que leva a mulher a depilar as axilas e o homem, em muitos casos, a deixá-la intacta, engloba dois conceitos culturais: a depilação e a DISTINÇÃO entre o que se convencionou ser culturalmente feminino e culturalmente masculino.

 Agora, gostaria de introduzir um novo conceito: o que é comum e o que não é comum e como, ao falarmos de "é natural" e "não é natural" estamos muito mais próximos de um julgamento CULTURAL do que é comum e não é comum para uma determinada sociedade do que de um julgamento natural. Na verdade, não existe julgamento natural algum ao usarmos o termo "natural" ou "antinatural", uma vez que qualquer coisa que advenha DA NATUREZA é natural, ainda que possa parecer INCOMUM para o nosso julgamento CULTURAL, como, por exemplo, algumas mutações ou grandes catástrofes.

 Peguemos dois exemplos triviais: uma mulher pintar o cabelo de loiro e depois de rosa. No primeiro caso, dificilmente alguém julgará tal mulher da seguinte maneira: não é natural. Não estou colocando aqui o conceito de ARTIFICIALIDADE que é uma acepção CULTURAL, mas sim o entendimento do que é ser NATURAL. Do ponto de vista cultural, ela poderá ser julgada sob o aspecto de que a cor do cabelo não é verossímil à cor original (natural) do cabelo. Mas a ação em si - o de pintar o cabelo de loiro - não será julgada como sendo "antinatural", apesar de ser, uma vez que naturalmente essa moça não possui cabelos daquela cor. O que se julga em questão, nesse primeiro caso, é se os RESULTADOS da ação serão considerados naturais ou artificiais. E por quê? Porque, em nossa sociedade, o fato de uma mulher pintar o cabelo é considerado "natural", donde natural é sinônimo de COMUM CULTURALMENTE e não de algo que provém da natureza. O segundo caso, no entanto, vai gerar mais discussões. Alguns, inclusive, falarão, ANTES DO RESULTADO, que "não é algo natural". Ora, o fato de pintar o cabelo não é algo natural em sua essência, mas o loiro, além de ser encontrado em algumas pessoas originalmente (naturalmente) e o rosa são, é muito mais COMUM. Quantas mulheres pintam o cabelo de loiro e quantas pintam de rosa? Dessa forma o conceito de natural passa pelo critério de ARTIFICIALIDADE - se se parece ou não com algo verdadeiro, original, da natureza - e pelo conceito do comum (se é algo frequente ou recorrente em nossa sociedade). Mas, deixando os conceitos culturais de lado, pintar o cabelo não é natural, simplesmente por utilizar manipulações químicas e intervenções que não estariam presentes sem a intervenção do homem. A única forma genuinamente natural de alterar a cor dos cabelos é pegar horas e horas de sol.

 Continuando com o exemplo acima, mas alterando o sexo percebemos com mais clareza como o conceito de natural misturou-se ao conceito cultural do que é comum ou não e do que é aceito ou não por uma dada cultura. Um homem, ao pintar o cabelo de loiro, possivelmente enfrentará muito mais resistência que uma mulher. Em caso desse cara lidar com pessoas mais preconceituosas, comumente ele ouvirá a frase "Não é natural um homem pintar o cabelo de loiro". Ora, mas se a mulher pode e, caso os resultados não sejam considerados artificiais pela maioria, dificilmente alguém a julgará, por que um homem não pode fazer o mesmo? Fica claro, mais uma vez, que o conceito nada tem a ver com natural de natureza, mas de comum ou não comum ou daquilo que a maior parte da sociedade aceita ou não aceita. Mas, quando se usa a desculpa de que é antinatural, parece que não existe um julgamento cultural preconceituoso, mas tão somente uma condição da natureza, donde podemos separar, sem interferências culturais, o que é natural daquilo que não é. Mas, como já foi mostrando aqui, em todos os casos pintar o cabelo ou se depilar não é algo natural. É comum ou não comum. É um julgamento valorativo de acordo com o que é comum ou não de acordo com uma determinada sociedade. Não há nenhum julgamento natural e se assim seguíssemos nossas vidas, deixaríamos de nos vestir, de pintar o cabelo e de nos depilarmos, pois tudo isso é antinatural.

 No caso da homossexualidade, o que parece mais estranho é o fato de - ao contrário de pintar o cabelo, depilar-se ou vestir-se - existem muitas espécies de animais que praticam sexo homossexual ou que tem comportamento homossexual. Logo, nesse aspecto, a homossexualidade seria muito mais natural do que pintar o cabelo, depilar-se, vestir-se. Aliás, partindo do pressuposto de que a homossexualidade não é algo inventado pelo homem, percebe-se com mais clareza o fato de que a sociedade julga o natural e o não natural sob um aspecto do que é comum ou não e pior do que é MORALMENTE aceito ou não.

 Dessa forma, não cabe o argumento de que a homossexualidade é algo errado, porque é antinatural, uma vez que foi demonstrado aqui que diversos atos considerados "naturais" não o são. E, ao contrário, a homossexualidade - que muitos dizem ser antinatural - é o mais natural dos exemplos aqui dados.

 Ainda pode haver uma resistência dizendo que a natureza inventou macho e fêmea e que os órgãos genitais do macho se coadunam com a da fêmea e vice-versa. Acontece que essa mesma natureza também criou seres hermafroditas - como no caso das minhocas - que possuem ovários e testículos. Na própria espécie humana, embora não seja comum, também existem seres hermafroditos. Dessa maneira seres híbridos - que não são macho nem fêmea - ocorrem naturalmente, sem interferências humanas.

 Por fim, alguns argumentam que não é natural, pois não tem como haver reprodução em um sexo homossexual. Mas, mais uma vez, na natureza existem animais que são naturalmente estéreis como a mula e o burro. Apesar de no geral terem órgãos sexuais pouco desenvolvidos, existem diversos casos documentados de que esses animais também transam, ou seja, o sexo sem reprodução também ocorre na natureza.

 2 - NA BÍBLIA DIZ QUE A HOMOSSEXUALIDADE É ERRADA.

Isso é correto. Existem passagens na Bíblia que mencionam isso. A problemática, no entanto, vai bem, além disso. Tendo a Bíblia como referência, a mesma diz, no novo testamento o seguinte:
"Ou não vos ensina a mesma natureza que é desonra para o homem ter cabelo crescido? Mas ter a mulher cabelo crescido lhe é honroso, porque o cabelo lhe foi dado em lugar de véu. Mas, se alguém quiser ser contencioso, nós não temos tal costume, nem as igrejas de Deus1 CO 11.14-16."

 Logo, mulheres de cabelo curto e homens de cabelo longo são tão desonrosos quanto um homossexual.

 Continuando, um trecho extraído da revista Superinteressante: "Se o Livro Sagrado proíbe a cobrança de juros, mas só entre judeus, o mesmo vale para a escravidão. Você pode ter escravos, contanto que "sejam das nações que estão ao redor de vós; deles comprareis escravos e escravas", diz o Levítico. Mas havia uma exceção: era possível a um judeu endividado vender a si mesmo para o credor."

 Dessa forma, é moralmente aceito pela Bíblia que as pessoas tenham escravos. Como não pode ser da mesma nação, nada impediria, para um cristão ortodoxo, comprar um escravo paraguaio, por exemplo, ele não estaria pecando, pelo contrário.

No Antigo Testamento, a poligamia era abertamente aceita, como demonstra trecho retirado da revista SuperInteressante:

 "Poucas coisas mudaram tanto nos últimos 3 mil anos como a instituição do casamento. Então esse é o nosso primeiro tópico. Para começar, o Velho Testamento deixa claro que as mulheres deveriam ser funcionárias de seus maridos. Funcionárias mesmo: não só com deveres, mas com direitos também. Se uma esposa fosse "demitida" pelo parceiro, por exemplo, podia ganhar uma carta de recomendação, que a moça podia usar como trunfo na hora de tentar uma vaga de mulher de outro sujeito.

Não é exagero falar em "vaga": um homem podia ter tantas esposas quanto quisesse (ou melhor: quanto pudesse adquirir e sustentar). A poligamia era a regra. Tanto que o primeiro caso aparece logo no capítulo 4 do primeiro livro da Bíblia: "E tomou Lameque para si duas mulheres" (Gênesis)”.

O Novo Testamento não fala muito sobre a poligamia, mas deixa claro que ela era comum e moralmente aceita. Em mais um trecho extraído da Superinteressante, temos o seguinte:

"O Novo Testamento não cita tantos exemplos de poligamia, mas sugere que ela ainda era comum no século 1. Jesus não toca no assunto, mas, em duas cartas, são Paulo recomenda que os líderes da nova comunidade cristã tenham apenas uma esposa porque "assim eles teriam mais tempo para dedicar aos fiéis". "O cristianismo só refuta a poligamia quando se aproxima do poder em Roma, que proibia a poligamia", afirma Brettler. Como escreve santo Agostinho no século 5, "em nosso tempo, e de acordo com o costume romano, não é mais permitido tomar outra esposa".

 Dessa forma, fica claro que a mudança, longe de ter sido moral, foi motivada por um caráter político.

Ademais, para os católicos, a própria Igreja Apostólica Romana, emitiu em meados de 1975 um aviso de que as interpretações da Bíblia não devem ser literais. E que a linguagem utilizada é muitas vezes metafórica e inerente àquela época.

Alguns religiosos precisam, além disso, deixar de ser egocêntricos. Em escrituras mais antigas e consideradas sagradas - os Vedas, por exemplo- que formam a base do Hinduísmo e foram escritos bem antes da Bíblia não existe qualquer menção de que a homossexualidade seja algo errado. Pelo contrário, nos Vedas existe a menção a três gêneros diferentes: os homens, as mulheres e o terceiro sexo. Vejam:

 “Os mecanismos da variação biológica do homem e da mulher “normais” sempre envolvem alterações no padrão de desenvolvimento. Mas isso não quer dizer, entretanto, que tais alterações são erros biológicos ou “erros” da natureza de Deus. As pessoas normalmente assumem que todo membro da sociedade humana deveria ser diretamente envolvido no processo de reprodução sexual, mas nós podemos observar que na natureza bem frequentemente não é esse o caso. Em muitas espécies altamente sociáveis, membros não reprodutivos têm um único e um importante papel. Por exemplo, numa colônia de abelhas, a rainha sozinha é a fêmea reprodutiva, enquanto que abelhas trabalhadoras são todas um “terceiro sexo” ou não reprodutivas e estéreis (...).

 "Na literatura védica, o sexo e o gênero dos seres humanos é claramente dividido em três categorias separadas, de acordo com sua prakriti, que traduzido literalmente significa “natureza”. Estes são pums-prakriti ou homens, stri-prakriti ou mulheres e tritiya-prakriti, ou o terceiro sexo. Estas três categorias não são determinadas por suas características físicas somente, mas por uma avaliação do ser humano total, que inclui o corpo físico, o psíquico e uma única consideração baseada na interação social (seu status procriativo). Geralmente o termo “sexo” se refere ao sexo biológico e gênero ao seu comportamento psicológico e identidade. O termo prakriti ou natureza, entretanto, implica ambos aspectos juntos como uma unidade intricadamente costurada e coesiva." trecho retirado do blog http://evolucaolgbt.blogspot.com.br/2010/03/chico-xavier-homossexualidade-e-os.html 

 Portanto, fica claro que se utilizarmos a Bíblia como parâmetro, vários dos nossos comportamentos também deveriam ser mudados. Algumas coisas consideradas moralmente aceitar pela sociedade deveriam ser revistas e outras consideradas imorais deveriam passar à categoria de moral. Por que somente a homossexualidade é atacada? E mais, por que os fiéis que atacam a homossexualidade, com base na Bíblia, não a seguem de maneira rígida e também cometem outros pecados condenados por um livro eles próprios usam pra dizer que a homossexualidade é errada? Nesse caso, nada mais justo que ou eles aceitam a homossexualidade ou eles serão obrigados a rever a vida deles também, pois caso contrário, estarão apenas se utilizando "dois pesos e duas medidas", longe dos ensinamentos bíblicos de fato aos quais eles tanto se apegam.

 Por fim, como já mencionado, não se pode querer impor a Bíblia à sociedade. Existem diversos livros sagrados de outras religiões, como os Vedas por exemplo. Dessa maneira, a imposição de que a homossexualidade é errada única e exclusivamente baseada na Bíblia, faz-nos perceber a ditadura religiosa pela qual algumas pessoas querem impor as convicções dela sobre as outras. E, como já mostrado, de maneira contraditória, eliminando-se a parte da Bíblia que não lhes convém e enfatizando as que convêm. Isso é religião ou manipulação?

3- DEUS CRIOU ADÃO E EVA E SE A HOMOSSEXUALIDADE FOSSE CORRETA, DEUS TERIA CRIADO ADÃO E IVO.

 Esse argumento é até engraçado. Alguns falam dessa forma, outros falam Deus criou o homem e a mulher. Correto. Mas e os hermafroditas aqui mencionados por quem foram criados? A minhoca não é um ser divino por que ela possui óvulos e espermatozoides simultaneamente? E no ser humano? Os hermafroditas são aberrações? Mas aberrações criadas por quem? Pelo demônio? O demônio pode criar aberrações? Mas se o demônio pode criar aberrações, então quem garante que a própria criação do homem e da mulher não seja uma aberração criada pelo demônio? O demônio é astuto, certo? Seria muito mais fácil ele criar algo que "parecesse natural", como no caso do homem e da mulher e induzir a sociedade a erro do que criar algo que o processo ser humano considerasse uma aberração. Dessa maneira, o demônio seria burro, longe da esperteza, do ardil e da sagacidade que essas religiões falam que ele possui.

 Fica claro, portanto, que na natureza e na espécie humana não existe somente o dual: macho e fêmea, mas também seres híbridos que carregam características de ambos.

 4- A HOMOSSEXUALIDADE É UMA DOENÇA

 No dia 17 de maio de 1990, a OMS retirou a homossexualidade da lista de transtornos mentais. Antes disso, em 1973, a Associação Americana de Psiquiatria já havia retirado. Em 1975, a Associação Americana de Psicologia fez o mesmo. Em 1984, a Associação Brasileira de Psiquiatria rechaçou a discriminação contra homossexuais, alegando que tais indivíduos não são prejudiciais à sociedade, Em 1999, a Associação Brasileira de Psicologia proibiu qualquer terapia que prometa a cura ou o tratamento da homossexualidade. Por fim, em 1991, a Anistia Internacional passou a considerar a discriminação contra homossexuais uma violação aos direitos humanos.

 Dessa forma, fica claro que tanto do ponto de vista médico, quanto psicológico, a homossexualidade não é mais encarada como uma doença, desvio ou qualquer tipo de perversão. Ademais, sob o ponto de vista científico, algo para ser considerado uma doença deve:

 1- Trazer prejuízos físicos ao organismo da pessoa.
 2- Trazer prejuízos psicológicos, mentais, emocionais ao organismo da pessoa e a outrem.
 3- Trazer prejuízos físicos e psicológicos simultaneamente.

 A homossexualidade não traz nenhum prejuízo físico ao organismo de alguém. Ninguém adoece ou tem o funcionamento orgânico prejudicado por ser homossexual, tampouco morre, perde alguma capacidade físico-motora, etc.

 Os prejuízos psicológicos, mentais, emocionais que um homossexual pode apresentar são todos em função do preconceito pelo qual o tema ainda é tratado. É óbvio que se você cresce em um ambiente em que seus pais, amigos e familiares falam que a homossexualidade é algo errado, a forma de você lidar com isso será delicada. Se desde criança foi lhe ensinado que a homossexualidade é imoral, ainda que você pense o contrário, caso você seja homossexual, terá que lidar com os preconceitos da família. E caso a família aceite, a pessoa ainda poderá enfrentar os preconceitos da sociedade.

 Dessa maneira, fica claro que os desequilíbrios emocionais enfrentados por muitos homossexuais não são inerentes de um conflito emocional interno, mas de um conflito emocional, a priori, totalmente externo que pode se interiorizar, ou seja, o motivador (a causa inicial) para um possível conflito nunca é a própria pessoa em si, mas um agente externo a ela.

Crianças pequenas (de 2, 3, 4 anos) têm demonstrado, em pesquisas e experiências tolerância em relação à homossexualidade. O mesmo não ocorre depois dos 5, 6 anos, idade em que muitas dessas crianças já foram incutidas de que a homossexualidade é algo errado. Mais que isso, crianças que são ensinadas desde cedo que a homossexualidade é algo normal, moral tanto quanto a heterossexualidade dificilmente terão problemas em lidar com isso no dia a dia ao avistarem casais gays. Ao contrário, se desde a mais tenra infância, o indivíduo é ensinado que a homossexualidade é imoral, errada, ela tende a se espantar, chocar-se ou tornar-se intolerante ao avistar casais homossexuais. Essas questões não valem somente para o âmbito familiar, mas para o âmbito escolar e social dessas crianças.

Fica evidente que a homossexualidade não preenche nenhum dos critérios estabelecidos para que seja considerada uma doença, ao menos do ponto de vista científico.

 5- A HOMOSSEXUALIDADE É IMORAL. É UMA PERVERSÃO MORAL

 Julgar algo como sendo moral ou imoral é um campo de discussão interminável, em que enveredamos pela Filosofia (Ética), Sociologia, Historicismo, crenças religiosas, achismos, preferências pessoais, histórias de vida, etc. Sem querer entrar em discussões mais profundas acerca da moral, o que transformaria esse texto em um conto sem fim, procurarei demonstrar exemplos quase uníssonos do que seja considerado moral e imoral em nossa sociedade (falo da sociedade brasileira) pelo senso comum.

 MATAR ALGUÉM - Salvo em casos extremos de Legítima Defesa ou para ajudar outra pessoa em perigo, um familiar nas mãos de um bandido, por exemplo, o ato de matar é considerado imoral pela quase totalidade das pessoas consideradas sãs.

 ROUBAR OU FURTAR - Da mesma forma, roubar, salvo em casos de extrema necessidade - a pessoa rouba um pacote de biscoito porque tem fome - e furtar são ações consideradas imorais pela quase totalidade das pessoas consideradas sãs.

CORRUPÇÃO, ESTELIONATO, LAVAGEM DE DINHEIRO

 Agora podemos questionar o porquê de ações como matar, roubar, furtar, etc., serem consideradas imorais.

 Primeiramente, em uma sociedade sem conflitos extremos - guerra civil, grande parte da população sedenta e desnutrida - matar, roubar ou furtar gera um desequilíbrio, uma desarmonia não necessária para uma sociedade relativamente estável. Se alguém sai na rua e é roubado, outros poderão temer ser roubados também. Semelhantemente, se alguém é morto na rua, outros ficarão inseguros em sair de casa e serem mortos. Em todos esses casos, houve uma quebra de harmonia na sociedade. Não se pode legitimar um assassinato, salvo as exceções já apresentadas, como algo moral, pois caso isso ocorresse a sociedade entraria em colapso. Não haveria garantia nenhuma de harmonia social, pelo contrário, alguém poderia ser morto a qualquer hora e, já que a ação não seria passível de punição, outros poderiam matar ou serem mortos e não haveria mais harmonia social. O mesmo ocorreria com o caso do furto e de roubos. Importante salientar que, independente da crença religiosa, achismos, preferências pessoas, visões de mundo, etc., legitimar o ato de matar alguém ou roubar alguém, em nossa sociedade, como algo moral, arruinaria os pilares básicos de harmonia social, ou seja, não estamos falando de qualquer julgamento baseado em juízos de valores, crenças ou preferências, mas tão somente sobre questões consideradas imorais, pois prejudicariam o bem estar da nossa sociedade. A esse grupo de ações imorais, daremos o nome de ações imorais de fato.

 Contudo, a grande problemática do conceito de moral e imoral ocorre justamente em questões não consensuais em que os juízos de valor, crenças, conceitos e preconceitos entram em cena. Uma mulher com microvestido pode ser considerada imoral "de acordo com as leis da moral e dos bons costumes". Mas que leis morais e dos bons costumes são esses? Certamente não estão no mesmo nível das supracitadas, pois uma mulher de microvestido não causa nenhum desequilíbrio social de fato. Pode haver uma perturbação de outras pessoas, mas porque essas consideram que uma mulher de microvestido é algo imoral e não porque a mulher de microvestido vai causar desarmonia na sociedade, impossibilitando a mesma de se manter harmoniosa.

 Não existe simplesmente a "lei da moral e dos bons costumes". Isso foi algo inventado e apreendido pelos indivíduos da nossa sociedade, no máximo, a maioria chegou a um consenso sobre isso, mas ainda assim, um consenso que está longe de ser uníssono. Para um homem solteiro e que procura sexo, uma mulher de microvestido pode ser interessante e moral. E, caso ele venha a transar com a garota de microvestido em questão, o que isso atrapalhará a sociedade? Em nada, obviamente a não ser, novamente para os famigerados moralistas com a simples repetição de que "isso afronta a lei da moral e dos bons costumes". Mas mais uma vez me perguntou que lei é essa? De onde ela veio? No que ela contribui para a harmonia/desarmonia de uma sociedade?

 É exatamente nesse patamar que a homossexualidade entra. Quando alguém diz que a homossexualidade é imoral, essa pessoa está se baseando em crenças, juízos de valor, "lei da moral e dos bons costumes" e não na harmonia/desarmonia da nossa sociedade. Fica evidente que a homossexualidade, quando é considerada imoral, não entra no critério de ações imorais de fato. Nesse caso e o da mulher de microvestido, daremos o nome de "ações imorais baseadas em juízo de valor”.

A grande pergunta que fica em questão é se podemos cercear os direitos de pessoas - como a mulher usar o microvestido ou um casal homossexual não poder se casar - com base nas "ações imorais baseadas em juízo de valor." Mesmo porque, nesse caso, não existe um consenso. Muitos defenderão a liberdade da mulher em se vestir da forma que ela quiser, afinal vivemos em um país democrático. Da mesma maneira, muitos defenderão o casamento civil homossexual alegando que os homossexuais têm os mesmos direito dos heterossexuais. As ações imorais baseadas em juízo de valor nunca são uníssonas, pelo contrário, muitos defendem essas ações, não só como sendo morais, mas como imprescindíveis para um país democrático.

 Ademais, o fato de a mulher usar um microvestido, não impede que outras que não concordem usem vestidos mais longos, calças, etc., ou seja, o microvestido não tira o direito de outras mulheres. Da mesma forma, o fato de que um casal homossexual possa se casar, não tira o direito de casais heterossexuais também se casarem ou ainda de alguém que não é homossexual ser obrigado a se tornar um homossexual. Nesses casos, não existe cerceamento de direitos, pelo contrário, uma ampliação de direitos com base em conceitos democráticos. Não estamos falando aqui que as pessoas terão que concordar ou achar moral uma mulher ir às ruas de microvestido ou um casal homossexual poder se casar, o que falamos é que concordando ou não, tirar essa liberdade dessas pessoas soa antidemocrático e ditatorial.

 6- Conclusão:

 Uma vez que:

1- A homossexualidade não é antinatural;
2- na Bíblia, apesar de haver menções contra a homossexualidade, também há várias que os fiéis ignoram;
3 - Deus não ter criado somente Adão e Eva;
4- a homossexualidade não ser considerada uma doença;
5- a homossexualidade não ser uma ação imoral de fato;

 Que tipos de argumentos, para além dos preconceituosos, poderiam legitimar a não aprovação do casamento civil homossexual em nosso país?