sexta-feira, 27 de agosto de 2010

O Paradoxo da Classe C: Onde ela está?



O Paradoxo da Classe C: Onde ela está?

Desde 2008, com a divulgação de dados da Fundação Getúlio Vargas (FGV), IBGE e IPEA (Instituto de Pesquisas Econômica e Aplicada), uma nova classe, até então pouco relevante, surgiu como o pilar da economia brasileira, tornando-se a grande vedete do comércio, da consolidação da classe média e da diminuição da pobreza no Brasil. É a classe C, a nova classe média. Mas o que é a classe C? Ela é de fato classe média?

Existem algumas discordâncias para estabelecer exatamente quem pertence à classe C. Para a FGV, famílias que ganhem entre 1.115 a 4807 reais pertencem a essa camada, ou seja, a camada média na pirâmide social brasileira. Um grande problema já decorre exatamente desse intervalo tão longo de mais de quatro vezes entre os limites inferior e superior. Outro problema é a não-análise da renda per capita dessas famílias. É muito difícil acreditar que uma pessoa que viva sozinha e ganhe 4.800 reais pertença à mesma classe social de uma família com cinco pessoas com rendimentos de 1.200 reais. Não seria o critério da renda per capita mais interessante e real?

Já para o IBGE, a classificação mais usual é a de que a Classe C se situe entre famílias com rendimento entre 3 a 10 salários mínimos. Mais uma vez, uma metodologia pouco esclarecedora e equivocada. Três salários mínimos são 1530 reais, 10 salários mínimos são 5100 reais. O triplo de diferença. Além disso, mais uma vez, é irreal pensar que uma família de cinco pessoas que tenha renda mensal de 1600 reais pertença à mesma classe de uma composta por um casal, por exemplo, com ganhos de cinco mil reais.

Dessa forma, podemos concluir, a priori, uma conceituação muito confusa do que seja a nova classe média brasileira. Claro que, quando se fala em classes sociais, há os intervalos máximos e mínimos, mas esses intervalos devem estabelecer as necessidades mínimas que caracterizem certa classe social, o que não ocorre com nenhum dos dois critérios;

Em primeiro lugar, devemos pensar o que é a classe média? Para o senso comum e para os principais institutos de pesquisa, classe média é a faixa da população que se situa entre a elite e a pobreza, por isso média. Para isso, contudo, os indivíduos desse segmento social devem apresentar algumas semelhanças: ter dinheiro para prover a alimentação de todos do lar, casa, vestuário, transporte, lazer. É justamente esses fatores, dentre outros, que separam a classe média da pobreza.

Em segundo lugar, há a necessidade de se pensar no custo de vida médio do país e talvez até por regiões, quando são estabelecidos os intervalos de classificação. Nesse contexto, que entra uma grande contradição entre os diferentes institutos de pesquisa. Para o DIEESE, que analisa o custo de vida nas principais cidades brasileiras, para uma família de quatro pessoas, manter-se minimamente com todos os preceitos mínimos do que seria o limite inferior da classe média, o rendimento deveria se situar na faixa dos 2.000 reais.

Em conseqüência do segundo problema, temos a divergência do que os principais institutos de pesquisa consideram classe média e o custo de vida real para pertencer à classe media. Pelo menos, acharíamos estranho, dentro desse contexto, acreditar que uma família de quatro pesssoas que ganhe menos de 2.000 reais pertença à classe média. Erro maior ainda é colocar dentro da mesma categoria pessoas que vivem com mais de duas vezes o necessário e pessoas que sobrevivem com quase a metade do necessário. O único contra-argumento plausível seria por em xeque a credibilidade do Dieese ao se analisar o mínimo necessário. Para isso, no entanto, precisaríamos de outras fontes que calculassem esse valor e como carecemos delas, até podemos questionar esses valores, mas não usar como referência outros institutos. Se não usarmos esse parâmetro, então utilizaremos qual?

Partindo dessa remuneração mínima, seria interessante agora nos perguntamos qual a parcela da classe C que se situa na faixa dos 1.200 aos 2.000 reais? Segundo o governo, pegando como referência a FGV, mais da metade dos brasileiros fazem parte da classe C. Mas nada mencionam sobre os que fazem parte da classe C cujos rendimentos familiares estejam entre 1.200 a 2.000 reais.

Um outro problema ao se falar da ascensão de pessoas das classes D e E (as categorias mais baixas da pirâmide social) ocorre quando inserimos outros dados na análise. A concentração de renda no Brasil, embora tenha caído, segundo as principais entidades de pesquisas e indicadores, ainda permanece muito alta. Ademais, a queda foi discreta. E mais, o Brasil permanece, segundo a ONU, como um dos países mais desiguais do mundo. Segundo as Nações Unidas, a diferença entre os 10% mais ricos e os 10% mais pobres no Brasil é a quinta maior do mundo, empatando com o Equador e ficando a frente somente de países como Bolívia, Madagáscar, Tailândia, Haiti e Camarões. Ora, se houve real ascensão da camada mais baixa da população para a classe C, como os indicadores de disparidades sociais caíram tão pouco?

Não seria mais interessante pensar que houve um aumento real de salário de uma maneira geral dos brasileiros e não de ascensão social? Por exemplo, com relativa estabilidade financeira, ajudas sociais do governo e maior oferta de crédito, a grande massa da classe D passou a ser considerada classe C. Quem antes tinha rendimento mensal de 800 reais, passou a ter rendimento mensal de 1.200 reais, por exemplo. Mas será que a vida delas de fato melhorou ou esse aumento de salário acompanhou o aumento da inflação? Qual ganho real teve essa pessoa cujo rendimento passou de 800 para 1.200? Além disso, o poder de compra dela de fato aumentou ou ficou facilitado por empréstimos, cartões de crédito e parcelas a perder de vista? É difícil pensar numa ascensão tão brutal das classes mais baixas para a classe C, sendo que a distribuição de renda brasileira não sofreu muita alteração. Como isso se deu então? E se houve uma melhoria no Brasil por que o país despencou dez posições no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) divulgado anualmente pela ONU? É verdade que o IDH brasileiro melhorou, mas menos que a média mundial, o que fez com que o país perdesse algumas posições. Mas se houve grande ascensão social, se a classe média agora é majoritária no país, então algumas dessas pesquisas ou mais de uma está bastante equivocada. Todos os dados, quando comparados, entram em paradoxo e criam conflitos. Onde está a classe C?

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